ATA DA SEGUNDA SESSÃO SOLENE DA TERCEIRA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA LEGISLATURA, EM 07.03.1991.

 


Aos sete dias do mês de março do ano de mil novecentos e noventa e um reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre, em sua Segunda Sessão Solene da Terceira Sessão Legislativa Ordinária da Décima Legislatura, destinada a assinalar o transcurso do Dia Internacional da Mulher, a ocorrer amanhã, conforme Requerimento n° 11/91 (Processo n° 77/91), de autoria do Ver. José Valdir. Às dezessete horas e trinta e três minutos, constatada a existência de "quorum", o Sr. Presidente declarou abertos os trabalhos e convidou os Líderes de Bancada a conduzirem ao Plenário as autoridades e personalidades presentes. Compuseram a Mesa: Ver. Airto Ferronato, 1º Vice-Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; Srª. Ruth D'Agostini, representando o Prefeito Olívio Dutra; Srª Patrícia Noronha, da Pastoral da Mulher Pobre; Sra. Cleomar Marcilla, do Coletivo Feminista de Porto Alegre; Ver. José Valdir, proponente da Sessão e, na ocasião, Secretário "ad hoc". A seguir, o Sr. Presidente pronunciou-se acerca da presente solenidade e concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Ver. João Dib, em nome das Bancadas do PDS e PFL, dizendo que todos os dias deveriam ser da mulher, leu trechos do livro "Com amor e ironia", de Lin Yutang, acerca da igualdade que pode ser alcançada entre os homens e mulheres a partir do momento em que tiverem, também, acesso a recursos idênticos. O Ver. José Valdir, como autor da proposição e em nome das Bancadas do PMDB, PTB, PL, PCB e PSB, discorreu sobre a alienação a que foi submetida a mulher em nossa sociedade, comentando o significado da reinserção do feminino na nossa história e solidarizando-se com as mulheres em sua luta pela libertação. O Ver. João Motta, em nome da Bancada do PT, teceu comentários acerca da forma discriminatória como muitas vezes a mulher é tratada pelos meios de comunicação, bem como da força que podem possuir esses meios como veículos de informação e conscientização. Disse estar apresentando Projeto de Resolução que institui o Prêmio Jornalístico Carmem da Silva, concedido a trabalhos referentes à mulher em nossa sociedade. E a Verª. Letícia Arruda, em nome da Bancada do PDT, dizendo ser a luta pela emancipação da mulher uma das grandes causas do nosso tempo, atentou para os diversos problemas que ainda enfrentam as mulheres, em especial quanto a sua discriminação nos locais de trabalho e à falta de uma devida assistência médica e social. A seguir, o Sr. Presidente concedeu a palavra às Senhoras Patricia Noronha e Cleomar Marcilla, que discorreram acerca dos objetivos buscados e da luta das mulheres em nossa sociedade. Ainda, o Sr. Presidente registrou a presença, na Casa, da Profª. Judite Dutra, 1ª Dama do Município de Porto Alegre. Em continuidade, o Sr. Presidente agradeceu a presença de todos e, nada mais havendo a tratar, declarou encerrados os trabalhos às dezoito horas e dezesseis minutos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelo Ver. Airto Ferronato e secretariados pelo Ver. José Valdir, Secretário "ad hoc". Do que eu, José Valdir, Secretário "ad hoc", determinei fosse lavrada a presente Ata que, após lida e aprovada, será assinada pelos Senhores Presidente e 1º Secretário.

 

 


O SR. PRESIDENTE (Airto Ferronato): Srs. Vereadores, senhoras e senhores, a Câmara de Vereadores de Porto Alegre faz hoje uma Sessão Solene para lembrar o Dia Internacional da Mulher, que é registrado no dia de amanhã, dia 8. Foi uma feliz iniciativa do Ver. José Valdir, da Bancada do PT, que propôs este ato para que os legisladores da capital gaúcha dediquem parte do seu tempo para uma reflexão.

Nos anos recentes da história mundial, e também do Brasil, muitas barreiras discriminatórias foram superadas, e o papel da mulher passou a ser melhor dimensionado. No entanto, entidades e organizações democráticas, enfim, a sociedade como um todo, deve ainda deter-se nas constantes injustiças que atingem as mulheres em geral. Por isso, a Câmara Municipal de Porto Alegre assinala o Dia Internacional da Mulher, saudando a todos que de uma forma incansável e altruísta participam das mais variadas organizações e entidades para defender e denunciar pessoas e instituições que não respeitam a dignidade da mulher.

Nesta Sessão Solene, o povo de Porto Alegre, através de seus legítimos representantes faz justiça, reconhecendo a participação efetiva da mulher no progresso e no desenvolvimento. Srs. Vereadores, senhoras e senhores, informamos que o Ver. José Valdir, que é o proponente desta Sessão Solene, que falaria em primeiro lugar, cede o tempo ao Ver. João Dib, que fala pelas Bancadas do PDS e do PFL.

 

O SR. JOÃO DIB: Ver. Airto Ferronato, que preside esta Sessão; Drª Ruth D'Agostini, que representa o Sr. Prefeito Municipal; Verª Letícia Arruda, Srs. Vereadores, minhas senhoras e meus senhores, demais representantes de autoridades, aqui presentes.

Serei muito breve no meu pronunciamento, em nome do PDS e do PFL. Sou frontalmente contrário ao Dia Internacional da Mulher. Todos os dias deveriam ser da mulher. Acaso a dona Júlia, minha mãe, não é mulher? Acaso a minha irmã não é uma mulher? A criatura a quem eu mais amo, não é uma mulher? Ela é a mulher. Acaso a Verª Letícia não é uma mulher? A Tenente Márcia não é uma mulher? As nossas assessoras aqui do Plenário, que nos ajudam, e que, com competência, com dedicação, fazem com que as sessões fluam com normalidade. Acaso o Prefeito desta Cidade que, inteligentemente, não se fez representar por uma mulher competente, eficiente, capaz, trabalhadora? Então, na verdade, todos os dias deveriam ser da mulher. Quando falo em mulher, eu fico com Lin Yu Tang, que no seu livro "Com amor e ironia" assim se expressa: "As mulheres são seres humanos exatamente como os homens, iguais na capacidade de julgar e cometer erros. Se lhes derdes a mesma experiência do mundo, e os mesmos contatos com este. Iguais na capacidade de realizar trabalho eficaz e conservar a cabeça fresca, se lhes derdes o mesmo treino nos negócios. Iguais no descortino social se não as trancardes em casa. E finalmente: Iguais na capacidade de governar, pois se as mulheres governassem o mundo não poderiam estabelecer uma maior confusão do que o fizeram os homens."

Encerro, Sr. Presidente, Srs. Vereadores, dizendo que a vida é bela quando a olhamos através de um cristal colorido que é a mulher. Portanto, mulher, todos os dias são teus! Obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Nós convidamos também a fazer parte da Mesa a Sra. Cleomar Souza, do Coletivo Feminista de Porto Alegre. Convidamos as demais pessoas aqui presentes que, caso queiram, fazer parte aqui conosco, que ocupem os lugares aqui do Plenário. Temos a satisfação de contar também com a presença de Vera Ruschel e Luiza Alves, representando a Superintendente da LBA no Rio Grande do Sul, Drª Heloisa Mabilde.

O próximo Vereador que usará da palavra é o Ver. José Valdir, que falará como proponente e pelas Bancadas do PMDB, PTB, PL, PCB e PSB.

 

O SR. JOSÉ VALDIR: Senhores e senhoras, ao propormos esta Sessão Solene em comemoração ao dia oito de março, queremos mais do que reafirmar um compromisso, fazer um gesto concreto de solidariedade à luta das companheiras mulheres. Nós que no cotidiano reafirmamos este compromisso através da luta por leis que combatam a opressão específica que sofrem nossas companheiras mulheres, queremos apresentar como contribuição esta reflexão no dia de hoje.

É um grande desafio colocado pela nossa história reconciliar o homem com a natureza. Segundo Marx, todos os males humanos vêm da alienação do homem dos frutos de seu trabalho. O lugar das mulheres em nossa sociedade foi demarcado pela mais brutal alienação. À mulher foram retirados direitos, desde a igual oportunidade no trabalho, o igual acesso à qualificação, à educação e à representação política, até o direito de decidir livremente pelo seu próprio corpo.

Para falarmos da opressão das mulheres situada historicamente no período capitalista, é preciso dizer que foi essencial para este sistema prosperar o desenvolvimento de um controle estrito sobre o corpo e a sexualidade, conforme a obra de Michel Foucault, "História da Sexualidade."

Começa a se construir, assim, o corpo dócil do futuro trabalhador que vai ser alienado do seu trabalho e não se rebelará. Este mundo reservou às mulheres o lugar limitado da vida privada, mas quando necessita a sociedade industrial alista as mulheres como força de trabalho, mas ainda que integradas ao mercado de trabalho limita-lhes as possibilidades, por serem mulheres.

A opressão das mulheres na sua dimensão subjetiva amolda comportamentos, normatiza a todos, sejam homens, sejam mulheres. Cada gesto na área pública, como no domínio privado, tem a marca do papel construído para homens e mulheres no sistema patriarcal como afirmou a feminista Simone de Beauvoir "não se nasce mulher, torna-se mulher", a dimensão humana desta limitação de papéis talvez seja a prisão mais profunda e fortificada do edifício da dominação.

Neste final de século e milênio, o que se apresenta para nós como avaliação da sociedade industrial?

Dois terços da humanidade passam fome, o terço restante superalimenta-se. Está colocada a possibilidade concreta da destruição instantânea do Planeta pelo arsenal nuclear já existente e, principalmente, a destruição lenta e contínua do meio ambiente. A exclusão dos valores femininos através da história e o enaltecimento dos chamados valores masculinos tem lugar fundamental nas causas desta tragédia.

A reinserção do feminino na História, resgatando o prazer, a solidariedade, e não a competição, a união com a natureza, talvez seja a única chance que tem a nossa espécie de continuar viva.

Cada vez mais as mulheres brasileiras estão presentes nas ruas, nos movimentos populares, no trabalho, nas escolas, nos sindicatos, nas lutas do campo e da cidade. No dia-a-dia, lutando por dignidade, liberdade e reconhecimento da igualdade, as mulheres rompem as amarras da sociedade autoritária e machista, conquistando espaços de participação, com sua voz, seu sonho, sua garra de construir um mundo novo.

Nesse caminho encontram desde as formas violentas e sutis de discriminação, opressão e exploração. Um País onde milhares de mulheres morrem em virtude de parto e de aborto, por falta de assistência médica, onde quase metade das mulheres são esterilizadas, onde a maternidade é um empecilho para o acesso ao trabalho, onde as mulheres são vítimas silenciadas da violência sexual e doméstica. Um cotidiano onde as mulheres arcam com o peso do trabalho doméstico, a dupla jornada de trabalho, a falta de creches para os nossos filhos, os salários inferiores aos dos homens.

Discriminadas porque são mulheres, exploradas porque vivem em um País governado por elites que alimentam o grande capital com o suor dos trabalhadores e trabalhadoras.

Por tudo isso nós reafirmamos nossos compromissos com a luta das mulheres por sua libertação, entendendo que desta luta surgirá um mundo novo, o lugar do desenvolvimento pleno das potencialidades como homens e mulheres, e - por que não dizer? - da própria felicidade. Porque não pode existir a liberdade e tampouco felicidade enquanto as companheiras mulheres não se libertarem. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Usará a palavra o Ver. João Motta, pela sua Bancada, o PT.

 

O SR. JOÃO MOTTA: Senhores e senhoras, a memória sobre a relação que existe entre a mulher, a comunicação e a sociedade é ainda pouco apropriada por todos nós. E muito menos sobre a forma em que esta relação atinge a mulher. Assim, os códigos, programas e mensagens difundidos através dos aparatos da TV, rádio, jornais e revistas, impossibilitam muitas vezes um desenvolvimento harmônico e construtivo da mulher com a comunicação.

Devemos estar atentos às manipulações e o modo utilitário como a mulher, muitas vezes, é tratada pelos veículos de comunicação. Na maioria das vezes controlada pelos homens. E este espaço pode contribuir na conscientização e na informação, como, por exemplo, divulgando dados e orientação sobre a saúde, sobre a educação, sobre a sexualidade, estabelecendo a difusão de novas idéias, construindo uma identidade cultural e nacional nova, afirmando também novos valores culturais e morais.

E o imaginário popular portanto, não pode ficar sendo alimentado por imagem feminina esteriotipada, manipulada por estes veículos, como se a mulher fosse um mero objeto decorativo. O símbolo sexual. Como se fossem criaturas servis, mental e fisicamente passivas. “Santas criaturas.” Como se fossem seres sem o direito de exercer livremente seus sentidos do prazer e da paixão. Emoções proibidas. A televisão, utilizada para proporcionar educação com informação e lazer, passa hoje a ser um instrumento muito valorizado e importante. E há inúmeros exemplos que podem ser estimulados, conhecidos, e legitimados por todos nós neste espaço, buscando a construção de uma nova relação entre o homem, entre a mulher, entre a comunicação e a sociedade. Os programas que abordam o tema da mulher já não se restrinjam somente a receitas culinárias, aos chamados tratamentos de beleza, às informações sobre os cuidados dos filhos. Também já abordam e se preocupam com temas que signifiquem auto-afirmação do gênero feminino, tanto levantando assuntos referentes ao tratamento diferenciado no mercado de trabalho, bem como até fatos que comprovam a existência de preconceito e discriminação.

Por tudo isso, senhores e senhoras, companheiras e companheiros, nós estamos apresentando à Câmara Municipal de Vereadores e a todos vocês presentes nesta Sessão, um Projeto de Resolução instituindo o Prêmio de Jornalismo Carmem da Silva a ser concedido anual e individualmente, que seria conferido, caso venha a ser aprovado, ao veículo de comunicação, à publicidade, ao programa, à matéria jornalística, aos comunicadores, aos jornalistas, aos que tratem da problemática mulher na sociedade contemporânea. Considerando a problemática da mulher na sociedade contemporânea como, por exemplo, alguns temas que situem a mulher como sujeito da informação, outorgando-lhe o tratamento e o espaço que lhe correspondem em nossa sociedade, em nossa cultura. Que apóiem a transformação, a evolução das mulheres em suas relações com a sociedade, que conheçam o direito das mulheres ocuparem cargos de direção, combatam a violência contra a mulher, contraponham-se à sujeição doméstica das mulheres e sua subordinação aos homens e que defendam a condição de cidadania das mulheres, afirmando sua dignidade e seus direitos. Este título seria concedido, caso venha a ser aprovado, por deliberação do Plenário da Câmara Municipal de Porto Alegre, através da proposição de um Vereador, sendo promulgada pelo Presidente, a cada ano.

Portanto, ao encaminhar esta proposta de resolução, estabelecendo de fato a possibilidade de nós premiarmos o veículo de comunicação, a publicidade, o programa, a matéria jornalística, os comunicadores, os jornalistas que contribuíram para a conscientização pelo menos para o questionamento da condição feminina que é imposto e vivido na sociedade patriarcal, nós achamos que estamos assumindo prática e efetivamente a tarefa de levar adiante este desafio histórico, social e político que é a luta pela igualdade da mulher.

Esperamos que este prêmio de jornalismo seja o justo reconhecimento e um incentivo para que difunda-se uma imagem real das mulheres em contraposição da imagem da mulher-objeto que historicamente tem si demonstrada. Para tanto, nada melhor, no meu entendimento, que este reconhecimento levasse o nome de Carmem da Silva, feminista e jornalista, gaúcha, escritora da Revista Cláudia durante muitos anos, numa coluna que ela própria observava quando dizia "consegui uma coluna à qual Deus - me perdoe a direção - deu o nome: "A Arte de Ser Mulher". Está certo, se você acha que acrobacia é arte, ela tratou de assuntos femininos, como redatora, na Revista, e, portanto, uma pessoa que possuía traços no seu espírito, de bom humor e ironia, escrevia artigos que caíam como verdadeiros "ufos" encadeados num marasmo em que dormitava a mulher brasileira na época. Carmem da Silva morreu em 29 de abril de 1985, em Rezende, RJ, durante uma conferência sobre jornalismo e feminismo, mas continua presente em homenagens como esta que estamos realizando hoje. Ao apresentarmos, Sr. Presidente, esta Resolução, fomos motivados fundamentalmente por dois argumentos. Primeiro, o de que o papel assumido pelas mulheres na sociedade contemporânea é fruto de profundas transformações e tais transformações determinaram outras tantas igualmente importantes no terreno das idéias e da produção cultural. Entretanto, localizam-se justamente no terreno ideológico cultural os obstáculos mais persistentes a estas mudanças e a estas transformações. Apesar das evidentes mudanças na estrutura social, muitos setores continuam raciocinando com esquemas teóricos antiquados, sob a égide do senso comum dos chavões e do estereótipo. Produzem e reproduzem a idéia empobrecida de mulheres frágeis e sem projetos. Desconsideram o sujeito feminino como criador de cultura, formador de consciência. E o segundo argumento que motivou a apresentação desta Proposta de Resolução é a importância que o veículo cotidianamente tem para milhares de pessoas através da forma ou desta possibilidade de ser um agente de informação e propaganda. E sua capacidade de estimular o imaginário e determinar a consciência dos indivíduos. Acreditamos firmemente que os meios de comunicação são, hoje, um elemento vital para que se favoreça a transformação da situação das mulheres nesta sociedade. Eles podem tanto ser um espaço onde as potencialidades femininas podem pôr-se e expor-se, como pode ser um instrumento da mentalidade e da estranha fantasia machista, através da consagração da vida da mulher ao doméstico e da reprodução de valores arcaicos e tradicionais.

Resta para nós, portanto, o combate político-ideológico que tem origens nas mãos e nas mentes das mulheres, e no coração, as quais acompanhamos solidariamente. Ainda gostaria de oferecer uma frase de Carmem da Silva, jornalista, - a todas as mulheres, companheiras assessoras, funcionárias, e a companheira Letícia Arruda, a nossa única companheira Vereadora. Também todas as feministas, presentes neste ato, que me parece que representa o desejo e o sonho que todos nós devemos cultivar nesta nossa convivência, aportando exatamente para isso que Carmem da Silva dizia nesta frase: "Mas eis que de uns tempos para cá a mulher passou a falar, reivindicando seu discurso, assumindo uma voz, a explicar-se por si mesma, na sua própria ótica." Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Concedemos a palavra à Verª Letícia Arruda para, em nome de sua Bancada, PDT, se pronunciar.

 

A SRA. LETÍCIA ARRUDA: Senhores e senhoras, “A história é um profeta com o olhar voltado para trás; pelo que foi e contra o que foi, anuncia o que será.”

Nesta citação de Eduardo Galeano, autor do clássico “As Veias Abertas da América Latina", parece evidente que uma das grandes causas do nosso tempo é a luta pela emancipação da mulher e pela afirmação de todos os seus direitos à igualdade com o homem, pois os preconceitos em relação a ela são tão antigos como a própria humanidade.

No Brasil dos nossos dias, a presença da mulher no cenário político, social, econômico, intelectual é cada vez mais marcante, servindo de exemplo no período da ditadura pós-1964, o Movimento Feminino pela Anistia, primeiro grupamento organizado contra a ordem então vigente.

Não menos importante é a presença das mulheres nas lutas sindicais e comunitárias; na defesa da reforma agrária; na organização dos partidos políticos; na luta contra a violência rural e urbana; nas escolas; nas cátedras universitárias; nas artes cênicas; na música; nas artes plásticas e na literatura.

Apesar de tais avanços e da universalidade da causa feminina, não é menos verdade que a todo momento, especialmente no Terceiro Mundo, resquícios de obscurantismo e barbárie procuram impedir a conquista pelas mulheres, do espaço que lhes compete ocupar numa sociedade moderna, atual.

E é com muito orgulho que, neste momento, falo em nome do Partido Democrático Trabalhista, o único que expressa em seu Programa o compromisso com a mulher, defendendo a sua participação em todas as áreas de decisão política e a definição de nossos direitos sociais pois preocupa-nos a situação dramática em que vivem milhões de trabalhadoras, o salário desigual, a violência a que é submetida a população feminina, a falta de proteção à saúde da mulher, a inexistência de uma infra-estrutura de creches e pré-escolas, a dupla jornada de trabalho se constituindo em obstáculo concreto à conquista da cidadania plena.

Entendemos, que não haverá democracia em nosso País com metade da população discriminada. Trata-se evidentemente, de se instituir novas formas de convívio, uma nova igualdade, que não reproduza as relações de opressão, essência da sociedade em que vivemos.

Entendemos, também, que este espaço conquistado traz implícita a criação de novas relações entre homens e mulheres; em outras palavras, significa que, sem esquecermos nossas questões específicas, nós trabalhistas, deixamos claro que nossa integração no processo de fortalecimento do Partido e no empenho por uma democracia popular não se dá isoladamente, mas dentro de um panorama geral de um povo inteiro humilhado, explorado, discriminado, que se rebela e se incorpora na luta por melhores condições de vida.

E mais, a humanidade só será livre na medida em que se proponha a libertação do conjunto social, o que pressupõe a divisão igualitária das posições de poder e prestígio, da cultura e da produção, assim como a distribuição eqüitativa das tarefas entre homens e mulheres.

Que este Dia Internacional da Mulher seja cada vez mais um motivo de reflexão e de luta desta chama crescente das conquistas que se solidificam no dia-a-dia, perpetuando-se através da história. Muito obrigada.

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: Com a palavra a Srª Patrícia Noronha, da Pastoral da Mulher Pobre.

 

A SRA. PATRÍCIA NORONHA: Sr. Ver. Airto Ferronato, presidindo os trabalhos desta Sessão Solene; Srª Ruth D'Agostini, representando o Prefeito Olívio Dutra;. Srª Cleomar Souza, do Coletivo Feminista de Porto Alegre, senhoras mulheres, Srs. Vereadores, e os homens presentes.

Em nome da Pastoral da Mulher Pobre e das Pastorais localizadas, da Igreja, nós gostaríamos de, neste dia, lembrar às mulheres pobres, às mulheres negras, que são oprimidas três vezes na sociedade, porque elas são negras, porque elas são mulheres, porque elas são pobres; pelas mulheres operárias, pelas mulheres donas-de-casa, lembrar as domésticas e todas as mulheres organizadas que lutam neste País, junto com o homem, para a construção de uma nova sociedade.

Gostaria de lembrar também a garra da mulher, a resistência e a coragem. Porque a mulher, apesar de tudo, tem muita fé e esperança que nós queremos, enquanto mulheres pobres, que trabalhamos nas comunidades, nas periferias, nós queremos saúde para os nossos filhos, nós queremos direito à escola, à alimentação. Nós queremos direito ao lazer para nós e para os nossos filhos. E no campo da atividade produtiva, que é o trabalho, um salário justo.

A gente gostaria de pensar e refletir se o salário-mínimo vigente neste País, se ele realmente comporta tudo isto para uma sociedade. A gente sabe que os pobres, que as operárias, as domésticas, a maioria nem o salário-mínimo ganha. Então, nós gostaríamos que a mulher tivesse o salário justo e digno, e lembrar também se a Constituição Federal prevê, e se a mulher vai para o trabalho ela é discriminada.

Se para a sociedade brasileira o homem e a mulher são iguais perante a lei, nós queremos também que a sociedade reconheça que a mulher tem uma jornada tripla, que ela trabalha em casa, a mulher pobre, a mulher do campo trabalha na roça, quando volta ela tem que cumprir as tarefas domésticas. Nós queremos também o respeito à sexualidade, direito ao uso de nosso corpo, direito a ter os filhos, a amamentar os filhos, não com o receio de perder o emprego. Salientar também a importância da participação da mulher na política, no engajamento do sindicato, nas organizações. Porque nós queremos, junto com o homem, transformar esta sociedade, em busca do nosso real, da nossa utopia. Então nós, mulheres pobres, queremos a igualdade. Muito obrigada. (Palmas.)

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: Concedemos a palavra à Srª Cleomar Souza.

 

A SRA. CLEOMAR SOUZA: Srs. presentes, senhoras presentes, quando a gente, depois de uma falação como a da Patrícia,vai falar, já se perde um pouco de alguma surpresa que se possa colocar. Mas quando se pensa, enquanto movimento, enquanto mulheres, o que fazemos hoje, aqui, na Câmara Municipal de Porto Alegre, numa Sessão Solene do 8 de março. Se pensa também em todas as companheiras que conosco estão nesta batalha. Se pensa nas companheiras que nos antecederam; se pensa nas noites que ficamos depois de nossa jornada de trabalho, sabendo que vamos ter a nossa jornada, a nossa dupla jornada em casa, sabendo que somos violentadas todos os dias pela sociedade que nos coloca. E ainda assim, temos um tempo aonde nos organizamos, aonde planejamos formas de colocar e tentar mudar isso que todos aqui sabem. Quando a gente começa a pensar, quando a gente vai falar num oito de março, a gente pensa em todos os oitos de março a partir da truculência que nós vimos nos Estados Unidos, em Nova York, quando ocorreu a queima de mulheres, em que se tentou fazer uma analogia de que elas eram tão maléficas quanto as bruxas da Idade Média. Então, quando se vai falar em nome de um movimento no oito de março, nós conseguimos somente entender e relembrar todos os momentos que nós lutamos pela não violência da mulher na sociedade, a violência que começa desde o momento em que lhe é expropriada a sua produção até o momento em que lhe é negado o seu direito ao prazer. E aí nós lembramos que ao fato de nós estarmos aqui, hoje, teve como precedente a luta de todas as mulheres, de todas as classes, de todos os partidos e de todo o mundo que consta aqui. E é cinqüenta por cento de toda a população. O fato de hoje nós termos, na institucionalidade, um apoio para a luta, faz com que a gente abra novos caminhos dentro do nosso movimento enquanto mulheres. Nós gostaríamos de reconhecer o trabalho dos Vereadores que estão propondo avanços dentro da lei de Porto Alegre. Mas temos ainda consciência de que somente a nossa organização autônoma, aquela que a gente faz entre as nossas grandes jornadas de trabalho, em casa e no serviço, levar à modificação da sociedade. A instituição, ela está, neste momento, dando um valor ao trabalho que é feito há séculos, desde o momento em que da mulher foi tirado o direito da sua produção, do seu prazer. E a nossa luta ela se dá em todos os campos, e, juntas, com todas as mulheres, que nós, hoje, estamos representando aqui. O eixo deste ano, para a nossa campanha, é a questão da violência. Não é este ano que a gente descobriu a violência. E não foi este ano que toda a sociedade calcou em cima da violência que é feita sobre a mulher. Nós estamos aqui cientes que todos nós identificamos no nosso dia-a-dia esta violência que acontece. Mas nós estamos cientes também de que, com a nossa força, das mulheres e dos homens que aliam à nossa luta, com a nossa organização, é que nós vamos, de fato, mudar esta situação. Nós estamos cientes de que a violência da mulher ela se muda e ela se constrói no nosso dia-a-dia. E nós estamos aqui chamando a todas as mulheres que juntem-se a nós, a todos os aliados que respaldem o nosso movimento porque outros oito de março virão até que nós possamos considerar que não necessitamos lembrar as truculências feitas pela sociedade e que nós possamos, por fim, discutir plenamente o nosso direito à produção e o nosso direito pelo prazer. Gostaria de deixar aqui meus parabéns por todas as companheiras feministas que vieram e aquelas que não estão aqui e que temos certeza que estão em algum momento, em algum lugar, contribuindo para a nossa luta. Obrigada. (Palmas.)

 

(Não revisto pela oradora.)

 

O SR. PRESIDENTE: Nós registramos a presença da Professora Judith Dutra, Primeira Dama do Município de Porto Alegre.

 

(Levanta-se a Sessão às 18h16min.)

 

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